Pesquisar este blog

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Coração Valente na Bahia

O Brasil é #Dilma13!
Ave Bahia, cheia de graça!
Linda interpretação da música que representa a mudança real.
E na Bahia ficou ainda mais linda!

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

O furacão Marina Silva

Impressiona-me a capacidade de desagregação partidária de Marina Silva, deixada como legado aos partidos que a abrigaram. Em 2010, sob a bandeira do PV, após a disputa presidencial, não restou pedra sobre pedra, e o PV até hoje amarga brigas internas que o fizeram retornar à condição de nanico político. Os verdes históricos, como Fernando Gabeira, sequer querem mais saber de disputar cargos eletivos por um partido que se queria sério.

Segue ilustração do problema verde:

Agora, com o PSB, a história se repete. Aquele que já foi um dia um partido de lutas sociais, de bandeiras políticas arrojadas, após a tempestade tropical Marina, tornou-se um arremedo de partido, que se entregou sofregamente ao canto conservador da sereia, negando sua história e envergonhando seus ativistas autênticos. Não é por menos que nomes consagrados do PSB, como a senadora Lídice da Mata (BA), a deputada federal Luíza Erundina (SP) e o presidente do partido Roberto Amaral, indignaram-se com essa postura subserviente do PSB. Até a vereadora do Recife Marília Arraes, prima do ex-presidenciável Eduardo Campos e neta de Miguel Arraes, declarou-se indignada com o apoio à direita dado nacionalmente pelo PSB.

A história é cruel: ou se aprende com ela, ou repetem-se os erros do passado. E Marina conseguiu dividir mais um partido, além de afundar sua reputação de partido de esquerda. Ou alguém duvida do destino do PSB como um PV de 2014?

Ilustrações sobre a derrocada do PSB:

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Democracia, Nordeste e tolerância

Toda eleição presidencial é a mesma coisa: o Nordeste brasileiro não vota como querem os paulistas e, pronto, lá vem uma enxurrada de ofensas racistas e xenófobas. Afora o fato de que a democracia pressupõe exatamente esse combate de ideias, prevalecendo aquela que conseguir mais adeptos, a expressão de ódio e preconceito que se vê nas redes sociais esconde algo mais grave.

As manifestações raivosas que se fizeram representar após o resultado político de ontem trazem uma proposta clara: um golpe à democracia. A não aceitação dum resultado democrático, seja ele qual for, revela um desejo mórbido de se impor pela força, de calar o diferente, de não permitir a expressão legítima do discurso contrário. Esses doentes políticos, que foram vistos nas manifestações de junho de 2013 portando cartazes exaltando a ditadura e a censura, são um risco à democracia.

Lembro-me de Locke, em sua Carta sobre a tolerância, afirmando que a tolerância é uma virtude a ser cultivada, mas que os intolerantes não devem ser tolerados numa sociedade saudável, sob o risco de ruir os princípios do convívio social e democrático. Por conta dessa ideia é que as sociedades civilizadas impõem sanções penais aos preconceituosos e aos propagadores do discurso do ódio. É uma forma de extirpar aqueles que trazem riscos aos princípios mínimos de civilidade e cidadania.

Ou seja, não é democrático tolerar o discurso racista, xenófobo ou homofóbico. Isso deve ser tratado como crime e um golpe mortal à democracia e aos direitos de cidadania. Deve-se tolerar e discutir todo tipo de ideia social, política, econômica ou filosófica, menos aquelas que usurpam, mesmo que implicitamente, o direito alheio de expressão legítima de sua cidadania.

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

13 anos de luz

Hoje faz 13 anos que meia dúzia de jovens (alguns nem tanto...) abnegados e cheios de ideais foram pela primeira vez, numa noite chuvosa de terça-feira, às ruas de Salvador para distribuir alimentos a moradores de rua: era 28 de agosto de 2001. Com o passar dos anos, esse grupo cresceu e muitos outros se incorporaram àquela nobre tarefa de alimentar desamparados, que se estendeu por todas as noites das terças-feiras por longos 8 anos. Foram momentos de muito aprendizado e crescimento. De muita doação pessoal de todos, de muito trabalho e de muito amor no que se fazia. Entregávamos na rua sopa, mingau, café, pão e água. E em muitos momentos acrescemos roupas, cobertores e atendimentos médico-odontológicos, propiciados pelos amigos da área de saúde.

E a caravana de carros saía na noite de terça-feira pelas ruas mal iluminadas de Salvador, por bairros e regiões algumas vezes perigosas, mas sempre confiante naquilo que se propunha a realizar. Sim, corremos alguns perigos, mas durante esses 8 anos nada aconteceu com qualquer membro da caravana.

A quantidade de material distribuído pelas ruas soteropolitanas cresceu e precisamos encontrar um local para organizar as tarefas e preparar os alimentos. Assim, diante da necessidade e com a colaboração de todos, conseguimos um local para o trabalho.

Com o conhecimento que passamos a ter das pessoas de rua, mantivemos contatos com suas famílias e estendemos o trabalho social ainda mais, entregando cestas básicas mensais a todas as famílias que conhecemos. Trabalho que era feito num sábado por mês, pela manhã, na sede do grupo, que incluía palestras de apoio social sobre saúde, higiene, direitos etc.

Os anos se passaram, e a dinâmica da vida nos levou para lugares e tarefas distintas. É o processo normal da vida social. O trabalho, em algum momento, teve de acabar. Conseguimos ajudar muita gente. Mas nos ajudamos ainda mais, pois todos saímos dessa etapa de nossas vidas um pouco mais humildes, mais autênticos e mais tolerantes com o outro.

Nesse dia de recordações doces que me vêm à memória, quero agradecer a todos os amigos que cultivei durante esse trabalho social: vocês, irmãos, são também responsáveis pelo que hoje sou. Aos atendidos, agradeço profundamente a oportunidade que me deram de me conhecer melhor e de ser também uma pessoa um pouco melhor, pois suas dor e dificuldade me fizeram compreender mais a realidade em que vivemos.

Hoje eu queria, em agradecimento, comemorar com todos. Mas aqui, na solidão do Planalto Central, eu apenas lembro e fico a rir sozinho daquelas terças-feiras maravilhosas!

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Por que #SOUDILMA - 3

Até entendo, mas não aceito, quando ouço ou leio um membro das classes mais abastadas se queixando dos governos populares do PT: é apenas rancor e sensação de perda de privilégios. Mas nunca entenderei as críticas que partem das camadas mais populares e trabalhadoras às políticas de inserção social e distribuição de renda promovidas pelos governos de esquerda. Aliás, talvez até entenda...

Os números são sempre cruéis em relação aos anos FHC (PSDB), como mostra o gráfico apresentado. FHC, e seu governo de elite, aumentou o número de pessoas em estado de pobreza em 4%, enquanto o governo Lula (PT) reduziu esse número em 36%! A comparação entre os governos de esquerda e de direita é uma covardia!

O mais surpreendente é ver pessoas, que se imaginariam racionais, babando seu ódio contra o PT e contra as políticas de redução de pobreza, por conta da corrupção, como se ela fosse uma exclusividade de um partido ou de um grupo político. Em vez de lutarem contra a corrupção em todos os níveis de governo (federal, estadual e municipal), preferem jogar fora as conquistas desses 12 anos de políticas sociais por conta da sua “raivinha” pouco elaborada cognitivamente...


terça-feira, 6 de maio de 2014

Chiquismo: a doença infantil do espiritismo

Por Randolfo*

O título é uma paródia a uma grande obra de crítica ao esquerdismo em detrimento do socialismo. E também nem guarda real proporção, pois o espiritismo não gera nenhuma doença - os espiritualistas que se dizem espíritas é que fazem isso.

Temos observado a derivação do movimento dito "espírita" no Brasil na direção contrária às recomendações da codificação e mesmo às particulares de Kardec. O espiritismo no Brasil não se orienta, na prática, pelas obras codificadoras e sim pelas obras de um único autor - Chico Xavier.

Infelizmente, esse autor não prezou pelos aspectos científicos ou filosóficos do espiritismo, preferindo enveredar por um caminho roustanguista fácil, o do religiosismo místico. E como a FEB privilegiou esse autor que tão bem serviu aos seus propósitos (vide Conscientização espirita, de Gélio Lacerda).


Nós temos um companheiro que costuma dizer que o problema não é o que se lê e sim o que se faz com o que se lê. A derivação religiosista, visando implementar uma verdadeira instituição religiosa no meio espírita, é mais fácil de ser seguida e compreendida, pois não requer maiores reflexões, tanto como também não estimula investigações, aferições. Mas, a culpa é de quem lê e não compara com a codificação, pois a codificação tem "linguagem difícil", ou é "muito complicada", nos dizeres de muitos que se dizem "espíritas".

Foi instituída, então, uma ditadura no meio espírita - o "chiquismo". É uma ditadura, pois foi massificada e assimilada pela maioria e absolutamente quase não há fóruns de debate sobre ela. Nota-se: em lugar NENHUM, seja congresso, seminário, simpósio que seja "espírita", abre-se espaço para se questionar NENHUMA obra de Chico Xavier. Muito pelo contrário - quem contesta esse autor é segregado, atacado e humilhado.

Não há como deixar de avaliar que o chiquismo possui instrumentos próprios para sua manutenção: tem base literária, coerência com seus princípios místico-religiosos e uma vasta rede de instituições, tanto como editoras e mídia que o suporta.

Conforme verificamos que o eixo de compreensão do espiritismo, segundo esse movimento, move-se exclusivamente na direção das obras de Chico Xavier e considerando o detrimento em que passa a se situar a codificação espírita, tanto quanto as claríssimas contradições existentes, eis que temos, agora, de fato, a instituição de uma religião. Mas, não se chama espiritismo, pois não se torna uma religião o que não se é.

Inaugura-se no Brasil o "chiquismo", uma religião sincrética, que por mera questão de marketing intelectual assume as feições do espiritismo, sem o ser.

Nota-se que mesmo os autores que seguem essa tendência são sempre ofuscados pela pressão desse grupo, que substituiu Roustaing (que a maioria estranhamente alega nem conhecer...) por Chico Xavier. Kardec ficou absolutamente em segundo plano.

Nota-se como no meio espírita se homenageia o citado autor, como se lhe enchem de julgamentos morais, enquanto o codificador do espiritismo jaz esquecido. Nunca é citado como exemplo moral (alguém mais notou isso?), nunca é citado como exemplo intelectual (também se notou isso?). Aliás, Kardec nunca é citado como modelo de espírita. Para os chiquistas, modelo de espírita é quem contradisse o espiritismo: Chico Xavier.

Nós, defensores do espiritismo, precisamos amadurecer e aceitar os fatos: há uma religião, ela é majoritária e o culto à personalidade é preponderante. E não se pode ignorar a comparação com os iniciantes anos do cristianismo: os ensinamentos de Jesus foram logo deturpados e ele, que não fundou religião nenhuma, viu seu nome ser utilizado para desvios absolutos, que culminaram até na perda de vidas.

E hoje Kardec é utilizado apenas de fachada para agredir-se justamente quem defende seus ideais...

A realidade impõe aos espíritas (uma classe bem mais minoritária do que imaginamos) não o combate a essa seita chiquista, mas o esclarecimento ao nosso povo.

A função do espiritismo é o esclarecimento. Nosso dever é prosseguir nisso. E como se faz? Divulgando a codificação e fazendo principalmente o que Chico Xavier nunca fez, nem tampouco seus defensores: BUSCAR A VERDADE.

Enquanto assistimos a essa nova seita afirmar que os dizeres desse autor são verdades absolutas, não assistimos à busca pela verdade, mas seremos cúmplices se ficarmos parados.

A luta pelo propriedade da expressão "espiritismo" não existe e nem pode existir. A luta pela verdade, sempre.

Queremos a verdade, queremos as obras mediúnicas submetidas à aferição, queremos a investigação dos fenômenos espirituais, queremos fazer novas perguntas para obtermos novas e verdadeiras respostas dos espíritos superiores. Queremos o espiritismo nos ESCLARECENDO e isso somente se dá por meio de informações fidedignas. O fanatismo em prol de uma única pessoa, um único espirito, um único autor, continua possuindo as mesmas características em todas as eras e momentos históricos. Quem seguia Hitler, por exemplo, o considerava infalível...

O chiquismo não precisa ser combatido. É mais uma religião e nada mais, perdida no meio de tantas outras - e a mais inexpressiva, pelo número de pessoas que a adotam. Enquanto evangélicos, que eclodiram somente a partir dos anos 60 no Brasil, hoje são metade da população do país, o chiquismo, essa doença infantil fruto da idolatria, que conta com a mesma idade, possui pífio 1% de nossa população. O chiquismo, então, só possui importância para os chiquistas - não para a imensa maioria do povo brasileiro.

Urge que façamos diferente e levemos o espiritismo verdadeiro a esse povo, carente de esclarecimento e do consolo que só vem pela verdade.

*Randolfo é moderador da comunidade "Eu sou Espírita - Espiritismo" do Orkut.

domingo, 4 de maio de 2014

Por que #SOUDILMA

Desde os meus primeiros votos, lá nos distantes anos 80, sempre votei nas esquerdas, porque para mim a direita sempre representou o opróbrio social, o tipo de política mais abjeta que se poderia imaginar, pois jamais pensavam na classe trabalhadora e apenas defendiam os interesses do capital. Assim, feliz e confiante, sempre fiz campanha aberta para a eleição do Lula, e cantando “Lulalá” conseguimos finalmente elegê-lo em 2002. Mas após o primeiro mandato do presidente Lula, envergonhei-me com sua política de concessões aos maiores bandidos da república nacional, tudo em nome da "governabilidade" e em busca de apoio no Congresso Nacional.

Já na eleição seguinte, 2006, não mais votei no PT, e guinei-me ainda mais à esquerda, optando sempre pelos nanicos radicais. E sempre anulando meu voto nos segundos turnos. E assim tenho votado desde então, sejam em eleições municipais, estaduais ou federais. Não votei no PT no segundo mandato de Lula e nem votei na Dilma. Considerava-me traído pelo PT. Afinal, onde foram parar todos aqueles ideais de mudança ética e de postura política responsável? Eu sei: nas mãos da quadrilha do PMDB (eterno governante real desse país desde a época do Sarney), nas mãos de pa$tore$ evangélico$ estelionatários enganadores de pessoas simples, nas mãos de ruralistas inescrupulosos que usam trabalho escravo e degradam impiedosamente o meio ambiente...

Tudo isso é verdade e vergonhoso! Seria necessário mudar, elegendo-se novos partidos de esquerda para governar o Brasil e dar continuidade ao sonho um dia embalado pelo PT. Quem sabe o PSOL, ou o PSTU, ou o PCB. Tanto faria, pois todos defendem os ideais de igualdade e tolerância na sociedade, levantando a bandeira do trabalhador. Se fariam concessões, se eleitos, não se sabe, mas se fizessem, buscar-se-iam outras legendas, sempre tentando levar a política brasileira a um patamar de decência e visões social e ambiental.

Mas há um perigo muito maior: o do retrocesso! E isso é inadmissível! Não se poderia jamais pensar em retroceder uma vírgula nas conquistas sociais e nos investimentos em reformas básicas, que é o que ocorreria numa possível vitória da inescrupulosa direita fascista brasileira. Ou seja, uma tragédia! Ao se comparar os 8 anos de governo do PSDB, em parceria com o DEM e o PMDB, com os anos sob o governo do PT, as diferenças são continentais, a distância entre as políticas sociais promovidas por um governo e por outro é abismal. Na imagem, apresento apenas um exemplo: investimentos em saneamento básico. Outras áreas, como mobilidade urbana (principalmente transporte público coletivo) e habitação popular, apresentam as mesmas características: a direita nada fez. Nada! Enquanto a política petista, à revelia de todos os seus problemas morais, foi capaz de mudar a cara desse país. E isso não é discurso político, são números que só um parvo condicionado seria capaz de contestar.


E o governo Dilma, atendo-me apenas aos números, foi ainda melhor. Os 4 anos de seu governo representam os maiores investimentos em serviços públicos já feitos por qualquer outro governo na história desse país (aproveito para parafrasear o ex-presidente Lula). Não há registros na história de qualquer outra coisa similar já feita. E desafio qualquer um a apresentar números tão contundentes como o do governo Dilma.

Ah, dirão alguns, e a corrupção? Bem, ela, infelizmente, é endêmica nesse país, e ocorre principalmente no nível menos vigiado: o municipal. Ali estão os maiores ralos de dinheiro público da nação brasileira. Mas por ser endêmica, é estranho, muito estranho, que só se fale da corrupção petista, esquecendo-se de toda a patifaria vergonhosa ocorrida nesse país para a aprovação da reeleição durante os anos FHC, ou do escandaloso processo de privatização de diversos setores econômicos, conhecido como “privataria tucana”, ou ainda dos muitos escândalos sufocados da época da ignominiosa ditadura militar (ou já se esqueceram dos casos Halles, Econômico, Eletrobrás, Lutfalla, Delfin, Capemi etc.?). Não, não se busca justificar a bandidagem petista com bandidos de outros tons políticos. Todos são bandidos, e essa é a grande diferença, e não apenas o PT. Assim, justificar o ódio irracional nutrido contra o PT por conta da corrupção é apenas exibir com detalhes as dificuldades cognitivas e informativas daqueles que optaram por esse caminho do rancor político.

Exijamos sim a decência política sempre! Precisamos de representantes que honrem esse povo trabalhador. E quem não o fizer, que vá para a cadeia, seja de qual partido for. E não apenas de um partido, como hoje ocorre nesse país...

Quais as minhas opções reais? Continuar com os investimentos sociais promovidos pela Dilma, principalmente em educação, saúde e infraestrutura urbana, ou virar à direita para acabar com esses investimentos que beneficiam principalmente os socialmente vulneráveis, para retroceder em direitos trabalhistas extinguindo auxílio maternidade e férias remuneradas, como pretende o PSDB e seu candidato do famoso helicóptero, para entregar de vez esse país aos bandidos das igreja$ evangélica$, como pretende a companheira de chapa da candidatura do PSB. É, acho que a opção é clara.

Não, não cairei no discurso pueril e inconsequente de ódio ao PT, como alguns mais incautos fazem ao ouvir o canto da sereia emitido por uma imprensa cooptada. Serei mais responsável com meu voto dessa vez e escolherei aquilo que realmente poderá ser o melhor para o país.

Por isso, declaro: dessa vez, #SOUDILMA

segunda-feira, 21 de abril de 2014

Diálogos palestinos - I

Ele:
- Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de deus. (Mt 5,9)
Um seguidor:
- Puxa, que bacana...
Ele:
- Mas agora, aquele que tiver bolsa, tome-a, como também o alforje; e, o que não tem espada, venda a sua capa e compre-a. (Lc 22,36)
Um seguidor:
- Não entendi, se é para pacificar, para que comprar uma espada?
Ele:
- Raça de víboras, como podeis vós dizer boas coisas, sendo maus? Pois do que há em abundância no coração, disso fala a boca. (Mt 12,34)
Um seguidor:
- Calma, tio, é só uma perguntinha! Eu só não tinha entendido. Aliás, continuo sem entender...
Seguem-se vários eventos até sua prisão.
Um seguidor:
Estendendo a mão, puxou da espada e, ferindo o servo do sumo sacerdote, cortou-lhe uma orelha. (Mt 26,51)
Ele:
- Embainha a tua espada; porque todos os que lançarem mão da espada, à espada morrerão. (Mt 26,52)
Um seguidor:
- Porra, cara, decida o que tu queres! Para que comprei então essa espada? Para brincar de soldadinho?
Ele:
- Não cuideis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer paz, mas espada. (Mt 10,34)
Um seguidor:
- Ah, vai à merda...

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Spiritualism in Brazil: alive and kicking

O texto completo está traduzido logo abaixo
http://www.csicop.org/specialarticles/show/spiritualism_in_brazil_alive_and_kicking/
Por Kentaro Mori
June 2, 2010

In continental Europe and particularly in Brazil, a branch of Spiritualism called Spiritism is developing and evolving into a new religion.

We have all seen old Victorian illustrations of ghosts as white sheets of cloth and poorly faked photos of spirits created by double exposure, mainly resulting from the Spiritualist movement in Britain and the United States. The movement saw its peak at the end of the nineteenth century, and it’s mostly recognized as a fad today, almost a century later.

In some other countries, however, especially in continental Europe and particularly in Brazil, a branch of Spiritualism called Spiritism is still very relevant and evolving, making it a fascinating example of the development of a new religion. Followers will be quick to emphasize the distinction between the more widely known Spiritualism and Spiritism, which was founded by a Frenchman named Hypolite Rivail (1804–1869) under the pseudonym “Allan Kardec.” This fad, or fallacy, is being promoted in the name of science.

Chico Xavier

According to the Brazilian Institute for Geography and Statistics (IBGE), which conducts the official census, Brazil has the largest number of Spiritists in the world: over 2.3 million followers, around 1.3 percent of the total population and the third largest religious group, behind Catholics and Evangelicals[1].

All three groups are Christian; the Brazilian Spiritists give special relevance to “The Gospel According to Spiritism.” The most important leader of this movement in Brazil, Francisco “Chico” Xavier (1910–2002), is our main focus of interest here because he epitomizes Brazilian Spiritism.

Chico Xavier is said to have been a medium. His main form of mediumship, however, was “psychography,” that is automatic writing by which he claimed to contact the dead in the form of letters from the deceased and also new books by deceased famous authors.

By selling these “psychographed” books, of which Xavier is said to have authored nearly 400, the movement has been able to flourish and to promote charity works in a self-reinforcing loop where each chain reinforces the other with Xavier at the top. He was clearly not a “Sexy Sadie,” however; even in life Xavier, who lived modestly and never married, was already worshipped as a kind of ascetic saint. There is no evidence that the image of him upheld by his followers is not true. Nearly a decade after his death, and in the centenary of his birth, his life is being dramatized and promoted in major feature movies,[2] and it’s almost unthinkable to question Xavier’s public persona.

But a critical analysis of Chico Xavier’s paranormal claims quickly reveals their utmost frailty. I was myself surprised. Until I got a better look, I had always assumed Xavier’s claims had a kernel of truth. If they were not authentic paranormal phenomena, I thought they would at least prove unsolved and intriguing. On the contrary, that turned out not to be the case.

“Odorization”

A close friend of mine, Vitor Moura Visoni[3], managed to get one of Xavier’s biggest and closest associates, Waldo Vieira, to clearly state that Xavier promoted hoaxes. Vieira should know because he was there.

“Workers from the Spiritist Center went to the line [of followers] to get details from the deceased. Or they used stories told by relatives in the letters where they asked for a meeting. The messages from Chico had this information,” Vieira revealed. That would explain his “psychographed” letters with details that “only the deceased had known.” More than cold reading, this was just plain hoaxing. There were other hoaxes, according to Vieira.

“I saw that [Xavier] was conducting some séances of which I was not part of ... where they sometimes told of Scheila’s [the spirit] perfumes... [Then] one day... he went to post something in the mail,... I went to his closet that had the door open and I intended to close it. When I got there, I saw a bag full of flasks... He used the perfumes... it was of roses... [I confronted him and] then Chico started to cry in front [of me].”

The use of scents allegedly of a supernatural origin was a common Spiritualistic trick. That the Spiritist leader and foremost “medium” in Brazil used them, according to one of his closest associates, is very revealing.

But nothing beats the case of Otília Diogo.

Sister Josefa



Just look at this photograph. Is that part of a comedy show? It may be funny, but not intentionally so. The photo was captured in 1964, and the man smiling in sunglasses is Chico Xavier himself. The person covered in white sheets is the medium Otília Diogo, or as Spitirists believe, the “materialization” of the spirit of sister Josefa in ectoplasm. Thanks to the mediumship of Otília Diogo, of course.

Other photos clearly show the medium behind the veil, and in fact, the veil had a rectangular semi-transparent part to allow Diogo to see. The alleged ectoplasmic materialization could be touched and also hold a heavy Bible. That’s very material indeed. And even believers noticed how the medium, Diogo, had a remarkable similarity to the face of the spirit.



And yet, they believed it. They still believe it. Xavier was there and he emphatically claimed the materializations were real and authentic. But the case would soon turn into turmoil.

The photos here were taken by Cruzeiro magazine, which had the utmost priority of selling more magazines. First promoting then exposing the hoax served them well. After first publishing an article where they left whether the “Uberaba materializations” were real open to interpretation, they then proceeded to expose the hoax they helped to promote.



Caught!

And expose they did. With clear photos it’s obvious that the “materialization” is simply the medium Diogo in sheets. Believers even claimed the spirit went through solid steel bars, but the photos show that it was simply some sheets thrown to the other side, while the very solid (and alive) medium was behind them.

Cruzeiro couldn’t have had better news when in 1970, Otília Diogo was finally caught red-handed. She wanted to have her wrinkles removed with plastic surgery, and as a payment for the surgery, she offered to conduct materialization séances in the house of the doctor, a believer. But the doctor was not that gullible and was suspicious of the small briefcase she always had with her. When he and his family managed to open it while Diogo was sleeping, they found all the “ectoplasm,” that is, all the very material garments and veils she used to portray different spirits.

Her tools even included some perfume used “to reinforce the presence of the spirit.” Just like Xavier, according to Vieira.

Finally exposed in her fraud, what would Diogo say? “I lost my mediumship in 1965, but I thought I should keep performing materializations. I didn’t want anyone to notice.”

And people believe it. Most Spiritists in Brazil, when informed about Chico Xavier’s involvement with the case of Otília Diogo, firmly believe that although she was definitely a hoaxer, she only started to hoax shortly after the phenomena was witnessed and authenticated by Xavier. That’s an amazing example of cognitive dissonance.

Even though the photos taken during those 1964 séances clearly show a person using veils and are obvious evidence of the hoax, many still believe that ectoplasm works in mysterious ways —including looking exactly like a common veil. We skeptics are still arguing with believers who staunchly defend the case with elaborate arguments —all of which have been refuted— but the first and obvious impression that one gets from the photos is quite right. Those are quite simply ridiculous hoaxes.

Smart People Believe Weird Things

Now, Waldo Vieira was also a witness during those séances, and he revealed that from the beginning they had their suspicions about Diogo. But he also claims that Diogo was also an authentic psychic, just as Xavier. Although a hoaxer at times, she also had extraordinary paranormal powers. The cognitive dissonance is complete.

Even if one accepts that these alleged mediums were hoaxers, the believer will convince himself that some of the phenomena must have been authentic. Paraphrasing the old quirky philosophical question, if a hoaxer is not caught hoaxing in the middle of the forest, did he hoax? To the believer, the answer is clear. The most elaborate and unthinkable arguments are presented to argue that those ridiculous hoaxes could, or even must, have been authentic.

Time and again one can find such examples, and the story of Otília Diogo, so famous in Brazilian Spiritism, is almost identical to the story of Florence Cook’s materializations of Katie King, which occurred almost a century earlier at the height if Victorian Spiritualism. She only started to hoax after the examination by William Crookes, the believers will argue. The Swiss contactee Billy Meier may have hoaxed some photos, but he must have started it after he had some authentic contacts with aliens from the Pleiades.

There’s much more in the story of Chico Xavier, certainly, since we didn’t even approach in any detail his main paranormal claim of 400 “psychographed” books. That’s for another opportunity.

But, as famous as he was for his moral guidance and spiritual messages published in hundreds of books, let’s end with a particularly interesting snippet: “The truth that hurts is worse than the lie that comforts.... Those who can will understand this.”

[1] The total number of atheists and nonreligious citizens in Brazil is probably comparable to and perhaps even greater than the number of Spiritists, however the IBGE refuses to tally the number of atheists in the Census.
[2] Many members of the Brazilian upper classes, including the entertainment elite, are Spiritists. It's considered more refined than traditional Catholicism.
[3] The work by Visoni is freely available in Portuguese at http://obraspsicografadas.org/.



Kentaro Mori is a Brazilian skeptic with his own website, Forgetomori.

*****************************************************
Tradução:
Espiritismo no Brasil e a dissonância cognitiva

Publicado por Gabriel Bassi
http://racionalistasusp.wordpress.com/2011/12/04/espiritismo-no-brasil-e-a-dissonancia-cognitiva/
Traduzido da Revista Skeptical Inquirer

Na Europa continental e particularmente no Brasil, um braço do espiritualismo denominado espiritismo se desenvolve e evolui numa nova religião.

Todos já vimos as antigas imagens vitorianas sobre fantasmas em lençóis brancos e em fotos desagradavelmente mal feitas de espíritos criados a partir de dupla exposição, principalmente resultado do movimento espiritualista no Reino Unido e nos Estados Unidos. O movimento atingiu seu auge no final do século XIX, sendo considerado um modismo dos dias atuais quase um século depois.

Porém, em alguns países, especialmente na Europa continental e particularmente no Brasil, um braço do espiritualismo denominado espiritismo ainda é muito significativo e continua evoluindo, fazendo-o um exemplo formidável do desenvolvimento de uma nova religião. Seus seguidores irão logo enfatizar a distinção entre a visão mais ampla do espiritualismo e do espiritismo, o qual foi fundado por um francês chamado Hypolite Rivail (1804-1869) sob o pseudônimo de “Allan Kardec.” Esse modismo, ou falácia, vem sendo promovido em nome da ciência.

Chico Xavier

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o qual conduz os censos oficiais, o Brasil possui o maior número de espiritistas no mundo: por volta de 2,3 milhões de seguidores, quase 1,3% da população total, e o terceiro maior grupo religioso, atrás somente dos católicos e evangélicos (1)

Todos esses três grupos são cristãos. Os espiritistas brasileiros dão especial ênfase para “O Evangelho Segundo o Espiritismo.” O líder mais importante desse movimento no Brasil, Francisco “Chico” Xavier (1910-2002), é nosso maior foco de interesse aqui, pois simboliza o espiritismo brasileiro.

Chico Xavier é considerado um médium. Porém sua maior forma de mediunidade é a “psicografia”, isso é, a escrita automática pela qual ele afirmava contactar pessoas mortas por meio de cartas “escritas” pelo morto, e também por meio de livros “escritos” por autores famosos já falecidos.

Vendendo esses livros “psicografados”, os quais Xavier escreveu por volta de 400, o movimento conseguiu florescer e promover trabalhos de caridade num loop auto-alimentado onde cada elo reforça o outro, tendo-se Xavier em seu topo. Obviamente não era nenhum Saxy Sadie, mas, mesmo em vida, Xavier vivia modestamente e nunca se casou, sendo adorado como um tipo de santo ascético. Não há evidências de que sua imagem divulgada por seus seguidores não fosse verdadeira. Quase uma década após sua morte, e no centenário de seu nascimento, sua vida foi dramatizada e divulgada em filme (2), é quase impensável questionar a pessoa pública de Xavier.

Mas uma análise crítica dos poderes paranormais de Chico Xavier rapidamente revela sua maior falha. Fiquei surpreso. Até o momento em que me aprofundei na pesquisa, sempre assumi que as afirmações de Xavier tinham algo de verdadeiro. Se não eram um fenômeno paranormal autêntico, pensei que ao menos se chegaria a algo insolucionado ou intrigante. Mas não foi o caso.

“Odorização”

Um amigo íntimo, Vitor Moura Visoni (3), procurou encontrar um dos maiores e mais íntimos afiliados de Xavier, Waldo Vieira, para verificar se Xavier promovia eventos fraudulentos. Vieira deveria saber disso, pois estava com Xavier.

“Trabalhadores do Centro Espírita faziam fila para conseguir detalhes de falecidos ou se utilizavam de histórias contadas pelos parentes nas cartas onde pediam por um encontro. As mensagens de Chico tinham essa informação”, Vieira revelou. Isso poderia explicar as cartas “psicografadas” com detalhes que “somente os mortos sabiam”. Mais que uma simples “leitura fria”, era justamente um falsificação legítima. Havia outras falsificações, de acordo com Vieira.

“Vi que [Chico Xavier] estava conduzindo algumas sessões espíritas nas quais eu não era participante... onde algumas pessoas às vezes relatavam sobre os perfumes de Scheila [o espírito]... [Então] um dia... ele foi colocar algo no correio,... fui até seu quarto, o qual estava com a porta aberta, pretendendo fechá-la. Quando cheguei lá, vi um saco cheio de frascos... Ele usou os perfumes... e eram de rosas... [Perguntei-o sobre isso] então Chico começou a chorar na minha frente.”

O uso de odores supostamente de origem sobrenatural é um truque espiritualístico comum. Tanto que o líder espiritista e mais destacado “médium” do Brasil o utilizou, de acordo com um de seus afiliados mais íntimos, é algo bastante revelador.

Mas nada ganha do caso de Otília Diogo.

Irmã Josefa


Olhe essa foto. É parte de um show de comédias? Pode ser engraçada, mas intencionalmente não é. A foto foi tirada em 1964, e o homem sorridente de óculos de sol é o próprio Chico Xavier. A pessoa coberta pelo lençol branco é a médium Otília Diogo, ou como os espiritistas acreditam, a “materialização” do espírito de Josefa em ectoplasma. Graças à mediunidade de Otília Diogo, é claro.

Outras fotos claramente mostram a médium atrás do véu, e, de fato, o véu possui uma parte retangular semi-transparente para permitir que Otília pudesse enxergar. A suposta materialização ectoplásmica pode ser tocada e também segurar uma bíblia. Isso é realmente muito material. E até mesmo os crentes noticiaram como a médium, Otília, possuía uma similaridade marcante com a face do espírito (abaixo).


E assim acreditaram. E ainda acreditam nisso. Xavier estava lá e enfaticamente afirmou que a materialização era real e autêntica. Mas o caso logo se tornou uma grande confusão.

As fotos foram tiradas pela revista Cruzeiro, a qual possuía a principal prioridade de vender mais revistas. Primeiro promover e então expor a fraude serviu como uma luva. Após publicar primeiramente um artigo no qual questionavam se as “materializações de Uberaba” eram reais e abertas a interpretações, procederam então para expor a fraude que ajudaram a promover.


Pegos no ato!

E então expuseram. Com fotos claras fica óbvio que a “materialização” é simplesmente a médium Otília em lençóis. Os crentes até mesmo afirmavam que o espírito atravessava barras de aço sólido, mas as fotos mostram que era somente alguns lençóis que eram jogados para o outro lado, enquanto a médium, muito sólida (e viva), estava por trás das barras.

A Cruzeiro não poderia ter tido melhor furo de reportagem quando em 1970, Otília Diogo foi finalmente pega no ato do crime. Ela queria fazer plástica para remover suas rugas, e como pagamento pela cirurgia, se ofereceu para conduzir uma reunião espírita de materialização na casa do médico, um crente no espiritismo. Mas o médico não era tão ingênuo assim, e ficou com suspeitas sobre uma maleta que sempre estava com Otília. Quando ele e sua família tentaram abri-la enquanto Otília dormia, encontraram todo o “ectoplasma”, isso é, todas as vestimentas e véus materiais que utilizava para interpretar diferentes espíritos.

Suas ferramentas incluíam até perfumes para “reforçar a presença do espírito.” Assim como Xavier, de acordo com Vieira.

Finalmente exposta a fraude, o que Otília poderia dizer? “Perdi minha mediunidade em 1965, mas pensei que poderia manter a encenação das materializações. Não queria que alguém percebesse.”

E as pessoas acreditaram nisso. Grande parte dos espiritistas do Brasil, quando informados sobre o envolvimento de Chico Xavier no caso de Otília Diogo, acreditou piamente que embora ela fosse definitivamente uma farsante, somente começou a difamar pouco tempo após Xavier ter autenticado e testemunhado os fenômenos. Esse é um exemplo clássico de dissonância cognitiva.

Mesmo que as fotos tiradas durante aquelas reuniões espíritas de 1964 claramente mostrarem uma pessoa utilizando véus, obviamente uma evidência falsa, muitos ainda acreditam que o ectoplasma funciona de maneiras misteriosas – incluindo se parecer exatamente como um véu comum. Nós, os céticos, ainda argumentamos com os crentes que defendem veementemente esse caso com argumentos elaborados – sendo que todos foram refutados – mas a primeira e óbvia impressão das fotos tiradas é um tanto certeira. São exemplos simples e ridículos de falsificações.

Pessoas espertas acreditam em coisas estranhas

Waldo Vieira também era testemunha dessas reuniões espíritas, revelando que desde o início já tinha suspeitas sobre Otília. Mas também afirma que Otília era uma psíquica autêntica, assim como Xavier. Embora fosse uma falsária às vezes, ela também tinha poderes paranormais extraordinários. A dissonância cognitiva é completa.

Mesmo se alguém aceitar que esses médiuns eram falsários, o crente irá se auto-convencer que parte do fenômeno falsificado é autêntica. Parafraseando uma questão filosófica antiga e peculiar, se um falsário não for pego em seu ato fraudulento no meio da floresta, ele cometeu a fraude? Para os crentes, a resposta é clara. Os argumentos mais elaborados e impensáveis são apresentados como argumento para aquelas fraudes ridículas que podem ter sido consideradas como autênticas.

Voltando no tempo novamente podemos encontrar exemplos de falsários. E a história de Otília Diogo, tão famosa no espiritismo brasileiro, é quase idêntica à história das materializações de Florence Cook feitas por Katie King, as quais ocorreram quase um século antes no auge do espiritualismo vitoriano. Os crentes irão argumentar que ela somente começou a fraudar provas após ser examinada por William Crookes. Bill Meier, o suíço que diz ter contatos com alienígenas pode ter falsificado algumas fotos, mas deve ter começado a fazer isso após ter tido alguns contatos autênticos com alienígenas provindos das Plêiades.

Certamente há muitas outras histórias sobre Chico Xavier, pois não entramos em detalhes na sua principal afirmação paranormal dos 400 livros “psicografados”. Essa é outra oportunidade de desmascará-lo.

Porém, como foi uma personalidade tão famosa por seus preceitos morais e mensagens espirituais publicadas em centenas de livros, terminaremos com um pequeno fragmento particularmente interessante: “A verdade que machuca é pior que a mentira que conforta… Aqueles que conseguem compreendê-la irão entender.”

Tá dááá!! Por hoje é só, amiguinho!

Referências

[1] O número total de ateístas e cidadãos não religiosos no Brasil é provavelmente comparável ou até maior que o número de espíritas, porém o IBGE se recusa a quantificar o número de ateístas no censo.
[2] Muitos brasileiros das classes sociais mais altas, incluindo a elite do entretenimento, são espíritas. Considerando-se mais requintados que o catolicismo tradicional.
[3] o trabalho de Visoni está disponível gratuitamente em português em 
http://obraspsicografadas.org/

terça-feira, 11 de março de 2014

A ciência, o espiritismo e a FEB

Eu tento. E tento de boa fé. Sério, mas é difícil! Foi assim: vi o anúncio dum evento na FEB, a Federação Espírita Brasileira, marcado para a noite do dia 10/03/2014, com o instigante tema “A física e o espiritismo, paralelo e convergências – A ciência e a ciência espírita”. Como é um tema que muito me interessa, decidi assistir-lhe. Cheguei cedo, cerca de uma hora antes da apresentação, e despendi o tempo na livraria para inteirar-me das novidades literárias.

O assunto é árduo, principalmente quando abordado para uma plateia sem maiores conhecimentos de filosofia da ciência, teoria do conhecimento e, claro, rudimentos de física. O palestrante teria pela frente responsabilidades em relação aos público e tema.

Para minha surpresa, o palestrante que falaria da física e suas relações com o espiritismo era um... médico! Bem, tinha esperanças que fosse alguém interessado e ilustrado no que seria tratado. Ouvi-lo-ia então, sem preconceitos.

O cardiologista começou por tentar definir algumas questões de filosofia da ciência e teoria do conhecimento, objetivando o nivelamento do público ao que abordaria, já que necessárias, como explicara. Definições de verdade, certeza, crença e conhecimento saíam com superficialidade e pouco cuidado, apresentando já as credenciais do que eu enfrentaria naquela noite. Mas quando resolveu caracterizar a ciência “ortodoxa”, qualquer esperança de bom senso se esvaiu imediatamente e meu interesse seguiu o mesmo rumo.

Uma digressão: sempre que ouço alguém falar de ciência ortodoxa, um sinal de alerta é imediatamente soado: estou diante dum discurso bobo, pueril e pouco elaborado. Não existe uma ciência ortodoxa e outra heterodoxa, existe ciência. Assim, quando se quer dar um ar científico a um discurso infundado, diz-se que é uma ciência, mas não ortodoxa, como o fazem a astrologia, a homeopatia, a psicanálise, a teologia, o espiritismo e outras tantas.

Pobre ciência, violentada num leito de Procusto, adequando-se às necessidades das pregações inconsequentes. Mas não sou Teseu, e resolvi apenas ouvir, apesar de angustiado pelo sofrimento atroz imputado à indefesa ciência. Indefesa porque o público, em sua maioria ignorante de seus princípios teóricos, cria estar diante de novidades que a aproximavam daquelas bobagens que se seguiam numa verborragia torturante. E eu quase podia ouvir os urros da vítima sendo esticada e amputada em partes essenciais naquele leito de horror.

E eu, na balbúrdia da minha mente, não obstante o silêncio exterior, refutava cada argumento, cada frase, relembrando as já distantes aulas introdutórias de epistemologia na academia. Como aquilo poderia ser tratado com seriedade por pessoas com um mínimo de entendimento filosófico? Até um aluno dos semestres iniciais de filosofia seria capaz de perceber os absurdos conceituais.

Após destratar a filosofia e a história, o capataz resolveu também deitar a física no mesmo leito. E eu assistia àquela sessão de tortura silente, incapaz de qualquer manifestação. Fui um covarde, assumo, pois estava muito próximo ao patíbulo para ousar intervir. E, enquanto me contorcia diante daquela tragédia, percebia que o público deliciava-se com as palavras, sem perceber a dor do conhecimento, aceitando-as como nova revelação, como o fazem todos que ignoram algo e não foram educados para a reflexão crítica.

Terminou como começou e um vazio preencheu meus sentimentos. Senti-me como um parente de vítima perseguida num anfiteatro romano: enquanto todos aplaudiam, eu sofria. Fui-me embora, na noite fria da capital federal, num ônibus vazio. E eu cheio de nada. Pouco a pouco percebi a mente retomando a reflexão, depois daquele espasmo intelectual, e lembrei-me duma frase que usara noutros tempos sem parcimônia: olha no que deu o espiritismo...

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Conhecendo a FEB

Estou em Brasília. E não resisti à curiosidade de conhecer a FEB. Ontem tomei coragem, peguei um ônibus na W3 e fui à L2 para encontrar com aquilo que considero o que há de pior no movimento espírita. É verdade, não fui de coração aberto: fui cheio de prevenções. Mas curioso, confesso. Fiquei impressionado com a estrutura física: a FEB é imensa! Conheci cada construção interna. No Cenáculo conheci a bela livraria, o imenso salão doutrinário, o museu quase inteiramente dedicado à Chico Xavier, inclusive com um boneco de cera sentado à mesa na entrada que me pareceu quase real, e alguns documentos expostos que me pareceram interessantíssimos, assinados por Kardec (um estava assinado assim: HLD Rivail, Allan Kardec). Tirei fotos. Depois fui ao prédio da Unificação, onde funciona a administração e o salão de reuniões do CFN. Tudo muito bonito. Ali também funciona a Biblioteca de Obras Raras. A parte mais interessante de todo o conjunto! Pude passear pelas obras e senti-me premiado ao manusear um autêntico Le Livre des Esprits, primeira edição. Claro, minha mulher fotografou-me nesse momento ao perceber a cara de menino feliz. E ela me fez tomar um passe (argh!!) no atendimento que acontecia naquele horário. Pegamos a programação de atividades e fomos embora com o compromisso de retornarmos no dia seguinte (hoje) para assistir à primeira palestra pública de 2014.

Chegamos hoje à FEB uns 20 minutos antes do início da palestra. Ainda quase ninguém. Passeei pela livraria e retornei aos documentos raros expostos na entrada do auditório. Entramos e sentamos. Ainda vazio. Faltam agora 5 minutos para o horário previsto e um homem e duas mulheres sobem ao palco e sentam à mesa. A mulher do centro faz uma prece (muito chata) e passa a palavra à outra mulher à sua esquerda. Essa lê um capítulo de Pão Nosso, de Emmanuel, e tece alguns comentários. Achei-os insuportáveis e impertinentes. E mais: desfiguraram aquilo que fora proposto como análise evangélica na obra lida. Vá lá, eu aceito que tudo não passava de prevenção minha, afinal era uma palestra na FEB. O homem então começa a palestrar e sua primeira frase foi: "Daremos hoje continuidade ao estudo da obra de Roustaing, Os Quatro Evangelhos". Confesso que minha vontade foi levantar e ir embora naquele momento, mas pensei: "na França, como os franceses" e educadamente fiquei quieto a ouvir um chavascal de impropriedades proferidas daquele púlpito "espírita". Quando ele citou o Jesus agênere, quase tive uma síncope nervosa e minha mulher me olhava a sorrir. Ao terminar a palestra, todos seguiram para a fila do passe, menos eu, pois saí direto à livraria para reler a RE 1866 e rever a opinião de Kardec sobre a polêmica obra rustenista, enquanto minha mulher tomava a hóst..., ops, o passe.

Ao sair, fui refletindo no ônibus sobre o papel da FEB, não para o movimento espírita, mas para o espiritismo e sua divulgação. Afinal, é isso mesmo que se pode esperar daquela que se autoproclama a Casa-Máter do Espiritismo?

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

A nossa falta de caráter cotidiana

 
Foi uma experiência curta: uma passada no mercado para suprir as últimas pendências da noite de Natal. Curta e esclarecedora. Esclarecedora porque o texto do estadunidense, que ora circula na internet(1), desancando o caráter do brasileiro ainda estava bem vivo na minha memória, afinal o lera na manhã desse mesmo dia. Lá é dito que os brasileiros, grosso modo, são maus-caracteres porque sempre querem levar vantagem em tudo (como não lembrar a famosa propaganda do cigarro Vila Rica de 1976(2) e a lei de Gérson: “Gosto de levar vantagem em tudo, certo?”).

Pois nessa curta passada no mercado pude presenciar a riqueza daquilo que é proposto pelo texto do gringo: todos somos espertos demais. Esperto como sinônimo de mau-caráter.

Os fatos:
1. Óbvio que o mercado estava lotado, e tolo seria aquele que, como eu, escolhera “dar uma passadinha” por lá na antevéspera do Natal. As filas dos caixas davam voltas pelo perímetro interno do imenso mercado. Como comprei poucos itens, escolhi a fila de pequenas quantidades, com vários caixas, supostamente criada para agilizar as pequenas compras. O casal atrás de mim na fila encontrou algum parente e o chamou para ficar ao seu lado, não obstante a fila estar imensa. Conversa vai, conversa vem, e a fila já tinha um novo integrante, que a alcançou já pela metade. Os que atrás estavam, problema deles, pois não passavam de otários...

2. Observei, enquanto aguardava as longas dezenas de minutos na fila, que havia várias embalagens abertas encostadas pelo percurso. Embalagens de uvas, de passas, de salgadinhos etc. Ou seja, algumas pessoas abriam as embalagens expostas nas gôndolas, consumiam parte do seu conteúdo e as largavam sem deixar rastros. E sem pagar, é óbvio, afinal não somos otários e queremos levar vantagem em tudo, certo?

3. Há um aviso indicando que aquela fila seria exclusiva para compras até 30 itens. Até aí morreu o Neves, pois desde quando o brasileiro respeitaria mesmo essa tolice? Um casal de idade madura, com dois carrinhos de mercado lotados de compras – provavelmente a compra do mês –, e sem nenhum constrangimento aparente, ocupou um dos caixas para pagá-las. A atendente do caixa chegou a levar uma bronca, provavelmente de sua supervisora, por conta do tempo excessivo com um único cliente, já que aqueles caixas seriam para atendimento rápido. Seriam num país civilizado, não para brasileiros sempre dispostos a fazer os outros de otários...

4. Mas a esperteza, ou falta de caráter mesmo, não é apenas do cliente, pois apesar de o mercado estar lotado, o que seria previsível pela proximidade da data natalina, vários caixas vazios, contei pelo menos 10, ilustravam com precisão que o empresário também quer levar vantagem em tudo, certo? E o cliente que se estresse nas longas filas, afinal ele é otário mesmo...

5. Ao sair, encontro um carro estacionado exatamente atrás do meu. O motorista em pé ao lado do seu veículo nem sequer esboçou reação de retirá-lo. Tive que fazer manobras para conseguir sair com meu carro. Imagino o que ele pensava enquanto eu manobrava naquele espaço exíguo: ”vai otário, daqui não saio”...

Talvez tenha visto até outras barbaridades como as aqui relatadas, mas a nossa intransigência com a falta de caráter já está tão esgarçada que imagino que muitas outras situações tenham passado sem serem percebidas.

É, somos mesmo um povo de merda! E o gringo tem toda razão em gritar para o mundo: viver no Brasil é um inferno e o seu povinho é uma desgraça!

Somos assim. E é por essas observações breves que entendo o tipo de representantes políticos que temos. O deputado, o senador, o vereador e o prefeito não são bandidos porque são políticos, são bandidos porque nós somos todos bandidos, nós somos espertos e todos os outros são os otários a serem trapaceados. Triste sina de um povinho mequetrefe...

Referências:
(1) http://www.geledes.org.br/em-debate/colunistas/22479-americano-cria-lista-de-motivos-pelos-quais-odiou-ter-morado-no-brasil#at_pco=smlre-1.0&at_tot=4&at_ab=per-3&at_pos=0
(2) http://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_de_G%C3%A9rson
Foto: os muitos caixas sem operação e, no detalhe, uma embalagem de uva aberta.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Crítica à obra "A crise da morte" de Bozzano

Segue brevíssima análise do aspecto metodológico da obra A crise da morte de Bozzano. Esse pequeno trabalho apresentei numa palestra no Teatro Espírita Leopoldo Machado (Telma), em Salvador, onde militava o saudoso Carlos Bernardo Loureiro. A análise é mais extensa do que a aqui apresentada, mas busquei reduzir sobremaneira os textos das citações e dos meus comentários, para que ficasse de mais fácil leitura.

1. Metodologia proposta: análise comparada.
“[...] material que se presta a ser examinado e analisado com fundamento na sua consistência intrínseca, que lhe confere um grau notável de probabilidade, da mesma forma que as narrações dos exploradores africanos se prestam a ser analisadas e verificadas, com fundamento em suas concordâncias..."

A comparação entre o material mediúnico analisado e "as narrações dos exploradores africanos" é estranha: é óbvio que o próprio autor poderia ir à África e retornar com suas próprias observações, atestando ou não aquilo que foi relatado anteriormente como verdadeiro ou falso. O mesmo não se poderia dizer da morte...

2. Ainda a metodologia: o ônus da prova.
“Ninguém pode afirmar ou negar a priori. O fato de negar ou de lançar ao ridículo as ‘revelações transcendentais’ equivale a pretender conhecer, de modo certo, o mundo espiritual, o que constitui presunção indigna de um céptico que raciocine...”

Da mesma forma que se pode afirmar sem provas, apenas amparado por um discurso pseudocientífico, poder-se-ia negar sem qualquer constrangimento. Mais há ainda algo mais sério nessa afirmação que vilipendia uma premissa científica: o ônus da prova é de quem propõe a hipótese. E isso, definitivamente, não foi feito pelo autor...

3. Metodologia: os médiuns.
“Se se chegasse a comprovar que um dos médiuns empregados ignorava absolutamente as teorias espíritas (o que excluiria a hipótese de uma colaboração subconsciente), seria conveniente experimentar com outros médiuns, para se obterem informações sobre o mesmo assunto; e assim por diante, sem que se estabelecessem relações entre eles.”

Médiuns que desconhecessem "as teorias espíritas" e que não tivessem relações entre si. Perfeito! Mas isso foi feito? Como são os exemplos trazidos por Bozzano?

4. Metodologia: como foi na prática.

“A coisa é teoricamente possível, mas de realização difícil, porque é raro que um só pesquisador chegue a encontrar numerosos médiuns, de maneira a poder levar a efeito uma empresa formidável como essa. Mais prático era, pois, aproveitar o material imenso que se acumulou [...], relativamente às ‘revelações transcendentais’, para empreender uma seleção severa de todas as peças, classificando-as, analisando-as, comparando-as, tendo o cuidado de colher informações sobre os conhecimentos especiais de cada médium, no tocante às doutrinas espíritas.”

Bem, aqui ele já começa a se desviar de sua proposta...

5. Metodologia: o corte metodológico.
“[...] todos os fatos, que citarei, de defuntos que narram sua entrada no meio espiritual são tirados de coleções de ‘revelações transcendentais’ publicadas na Inglaterra e nos Estados Unidos. “Por que – perguntar-me-ão os leitores – esse exclusivismo puramente anglo-saxônio? [...] é claro que, se os povos anglo-saxônios são os únicos que, até hoje, hão mostrado saber apreciar o grande valor teórico e prático das ‘revelações transcendentais’, como são os únicos que a isso se consagraram, empregando métodos racionais, não me restava outra coisa senão tomar o material necessário onde o encontrava.”

Esse corte epistêmico será analisado com mais propriedade num comentário feito no décimo-quarto caso apresentado.

6. Os casos: primeiro.
“Extraio este fato de uma obra intitulada Letters and Tracts on Spiritualism, obra que contém os artigos e as monografias publicadas pelo juiz Edmonds, de 1854 a 1874. Sabe-se que Edmonds era notável médium psicógrafo, falante e vidente. Alguns meses depois da morte acidental de seu confrade, o juiz Peckam, a quem ele muito estimava, [...]”

Um juiz que era notável médium psicógrafo, falante e vidente? Não eram para ser médiuns sem nenhum conhecimento sobre espiritualidade e sem relações com outros?

7. Os casos: terceiro.
“Reproduzo um último caso de data antiga, que extraio do livro do Dr. Wolfe, Starling Facts in Modern Spiritualism (pág. 388). ‘Jim Nolan’, o ‘Espírito-guia’ do célebre médium Sr. Hollis, que disse [...]”

À revelia do bobo erro na tradução feita pela FEB, pois não era Sr., mas Sra., o médium Sra. Mary J. Hollis era experiente, rica, membro da Igreja Episcopal e com excelente relações no meio espiritualista.

8. Os casos: quarto.
“[...] um fato tirado da obra de Mrs. Jessie Platts, The Witness. Trata-se de uma coleção de comunicações mediúnicas muito interessantes, obtidas graças à mediunidade da própria Mrs. J. Platts, viúva do Rev. Charles Platts, que teve a infelicidade de perder seus dois filhos na grande guerra. As comunicações publicadas provêm do filho mais moço, Tiny, rapaz de 18 anos apenas, morto quando combatia na frente francesa, em abril de 1917, e que se comunicou psicograficamente, mercê da mediunidade improvisada de sua mãe [...]”
“Termino lembrando que Mrs. Jessie Platts foi levada a cogitar de pesquisas mediúnicas e a tentar escrever automaticamente, pela morte de seus dois filhos na guerra. Ela, pois, nada conhecia – ou muito pouco – das doutrinas espíritas e tudo ignorava acerca do conteúdo das outras coleções de revelações transcendentais.”


Mais ou menos. O médium Sra. Platts levou mais de um ano entre a morte de seu filho Tiny, em 28/04/1917, e o recebimento da primeira mensagem em 03/07/1918. E em seu livro ela relata que durante esse período teve contato com as ditas doutrinas espiritualistas, apesar de afirmar ter sido pouco contato.

9. Os casos: sexto.
“A Sra. Duffey, que é de espírito muito cultivado, se tornou médium escrevente e escreveu as mensagens de que se trata, quando apenas havia pouco tempo que se interessava pelas pesquisas mediúnicas, quando, por conseguinte, ainda nada lera, ou muito pouco, sobre doutrinas espíritas.”

O médium Eliza B. Duffey, famosa feminista estadunidense, autora de diversos livros sobre saúde e educação da mulher, convertera-se um ano antes dessas comunicações ao espiritualismo e participava de uma sociedade espiritualista, dando inclusive palestras sobre o tema.

10. Os casos: nono.
“Tiro-o do recente livro de mensagens transcendentais intitulado A Heretic in Heaven. O médium-narrador é o Sr. Ernesto H. Peckham, conhecido pelas suas pesquisas metapsíquicas, o mesmo que precedentemente escreveu o belo volumezinho intitulado The Morrow of Death”

Conhecido por suas pesquisas metapsíquicas e já escrevera outra obra sobre o tema? Sem mais comentários...

11. Os casos: décimo-segundo.
“A mãe do autor das cartas (morto aos 30 anos, em 1918) começa por dizer que, não podendo consolar-se da morte de seu único filho, desejou pôr-se mediunicamente em comunicação com ele. Para esse fim, aconselharam-lhe fosse à Direção do British College of Psychical Science. Foi na sede dessa importante instituição que ela chegou a experimentar sucessivamente, com quatro dos melhores médiuns, [...] Por um deles – uma senhora dotada de faculdade para a escrita mediúnica – foi que recebeu do filho [...]”

Os melhores médiuns do centro de pesquisas! Sem mais comentários...

12. Os casos: décimo-quarto.
“Trata-se de uma santa mãe que se comunica por intermédio de sua filha. Orna a brochura o retrato da morta, cujos traços angélicos se harmonizam de modo muito sugestivo com o conteúdo das mensagens, das quais se exala o perfume celeste de uma bela alma, em suprema comunhão de amor com todos os seres do Universo. É tão espontânea, tão natural a forma em que são ditadas as mensagens, que sugere aos que as leem a intuitiva certeza da origem, autenticamente transcendental, donde promanam.”

Ou seja, a certeza da origem das comunicações é dada pela forma "tão espontânea, tão natural" das mensagens. Muito científico...

13. Os casos: ainda o décimo-quarto.
“[...] a hipótese ‘reencarnacionista’. Sabe-se que é o único ponto importante em que se depara com um desacordo parcial nas mensagens dos Espíritos que se comunicam: entre os povos latinos, eles afirmam constantemente a realidade das vidas sucessivas, ao passo que, entre os povos anglo-saxões, estão em desacordo, na proporção de dois terços que negam mais ou menos claramente esta forma evolutiva do ser humano, e de um terço que a afirma, de modo mais ou menos categórico. [...] Entretanto, conforme já o fiz notar em outras obras, este contraste de opiniões, relativamente a um problema insolúvel para os que o discutem – e, por conseguinte, essencialmente metafísico – nada significa, pois que os próprios Espíritos reconhecem que tudo ignoram a esse respeito e julgam do assunto segundo suas mesmas aspirações pessoais.”

Os relatos dos povos anglo-saxões sugerem, por cerca de 67%, que não existe reencarnação! Isso é muito significativo! Mas o autor resolve o problema dizendo que tudo não passa de discussão metafísica e que os espíritos não sabem de tudo! Resumindo a argumentação do autor: se a opinião do espírito serve para corroborar sua hipótese, ela é válida como prova; se a opinião, mesmo de 67% dos relatos, é contrária, tudo não passa de deficiências pessoais dos comunicantes. Não se pode negar que ele, ao menos, é muito esperto...

Mas fica uma pulga na orelha: 67% dos relatos mediúnicos trazidos nos países anglo-saxões afirmam não existir reencarnação! Isso sugere que o contexto talvez seja mais importante nos relatos mediúnicos do que supõe a nossa vã espiritologia...

14. Os casos: décimo-quinto.
“As mensagens mediúnicas que vamos reproduzir foram obtidas pela Sra. Rambova na residência de seu pai, situada nos arredores de Nice, com o auxílio do médium americano Jorge Benjamim Wehner, que também servia frequentemente para a fundadora da Sociedade Teosófica [...]”

Servia frequentemente de médium? Sem mais comentários...

15. Conclusões.
“[...] os informes que transcrevi deveriam bastar, para confirmação da grande verdade que ressalta dos casos dos médiuns improvisados, inteiramente ignorantes das doutrinas espíritas e que, não obstante, recebem mensagens concordantes, em que todos os detalhes coincidem com as outras narrações do mesmo gênero.”

Ops, o que eu perdi? Será que li outro livro ou o editor misturou a conclusão desse com a descrição de outro?

16. Ainda conclusões.
“Em primeiro lugar, cheguei a demonstrar incontestavelmente, fundando-me em fatos, que as mensagens mediúnicas, em que os Espíritos dos defuntos descrevem as fases por que passaram na crise da morte e as circunstâncias em que fizeram sua entrada no meio espiritual, concordam admiravelmente entre si, de maneira tal que nelas não se encontra uma só discordância absoluta com as afirmações dos outros Espíritos que se hão comunicado com os vivos.”

Das duas, uma: ou eu sou um completo maluco que não consegue compreender um texto rudimentar ou o autor acha que somos todos acríticos...

sábado, 21 de setembro de 2013

Um exemplo da "ciência espírita"


A falta de seriedade no trato científico faz o espiritismo tornar-se um arremedo de conhecimento, uma tolice inominável. E isso é uma pena...

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Eu, Mateus e um bom café



Nas minhas andanças por Salvador, em busca dos melhores cafés, conheci hoje um novo local: o Café Primaz. Um lugar muito simpático e calmo e com um café gostoso, apesar das poucas opções no cardápio. Situado atrás da Igreja da Sagrada Família, conhecida como Igreja das Doroteias, no bairro do Garcia, bem próxima ao Campo Grande. É fácil de chegar e tem estacionamento farto e gratuito.

Há ainda uma pequena livraria católica que compartilha o espaço interno do Café, com obras dogmáticas e filosóficas. E como livros são uma fraqueza do meu caráter, passei logo a apreciá-los, pegando um e outro, folheando alguns e consultando os preços apresentados. No meio deles, uma obra me chamou a atenção: um livro que fazia uma leitura comentada do evangelho de Mateus.

Alguém mais incauto poderia perguntar-se: “ele lendo um texto evangélico?” Sim, claro! E por que não? Deve-se ler sobre tudo, sempre em busca do conhecimento. E mais, dentre os textos evangélicos, o texto de Mateus é o que mais aprecio, pois é o mais descritivo, histórico e humano. Sim, humano, pois é o que retrata a personagem Jesus de forma mais humana. Afora uma ou outra bobagem do texto, que se pode reputar a problemas históricos e de dominação social, facilmente identificados nas interpolações e extrapolações que se destacam no contexto da obra, o livro é interessante e apresenta um homem bom com suas angústias, desassossegos, desejos e esperanças. Um homem que duvida, que sofre, que acalenta e apascenta. Ou seja, um homem pleno, com qualidades e problemas, virtudes e vícios. Nada divino. Humano, demasiado humano.

Por isso gosto da boa nova de Mateus, que se opõe ao texto joanino, cheio de intenções e voltado a um público menos crítico, que apenas quer crer, jamais pensar. Mateus, ao contrário, suscita a reflexão sobre os temas que se seguem na trajetória jesuítica, fazendo seu leitor mais consciente do papel do homem Jesus. Costumo dizer que João prepara ovelhas; Mateus dialoga com homens.

Saboreando o cappuccino do Primaz, lembrei-me dos textos por mim escritos sobre a moral proposta em Mateus ou o a fé humana de Jesus na perspectiva sinótica, vista a partir de Mateus, claro, por ser o melhor dentre os três textos que usam a fonte Q (pode-se dizer que Mateus e Marcos são praticamente o mesmo texto, com pequenas diferenças que destacam o público alvo e o contexto cultural de sua elaboração; já Lucas representa os passos iniciais da construção mitológica cristã, cujo ápice é alcançado no texto ruim dos discípulos de João).

Pois é, um café nos fundos de uma igreja trouxe-me reflexões evangélicas. Sem nenhuma conclusão ou mesmo nova análise: não havia pretensão intelectual. Trouxe-me apenas o desejo de ler aquele texto em minhas mãos que discute o bom evangelho de Mateus. Para quem quer conhecer um pouco sobre essa figura que marca profundamente a cultura ocidental, o homem Jesus, Mateus é, sem dúvida, a melhor pedida. Entretanto, sugiro como premissa um bom anteparo histórico neotestamentário e distância de discussões dogmáticas, pois o texto de Mateus é para saborear e refletir, jamais para crer.

Café Primaz, Igreja da Sagrada Família (Doroteias)
Avenida Leovigildo Filgueiras, 270, Garcia
Salvador, Bahia

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Um café com um ex-presidente

Os finais de tarde dos sábados em companhia dum bom café, cujos sabor e aroma me enlevam, e rodeado de livros numa boa livraria sempre trazem oportunidades de reflexão sobre temas que incomodam ou tangenciam algumas de minhas ideias. E essa tarde não foi diferente. Ao deleitar-me das novidades literárias e culturais deparei-me com uma inusitada: Pensadores que inventaram o Brasil, do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Confesso que relutei inicialmente em comprar e ler o novo livro do sociólogo e professor Fernando Henrique. E também confesso que minha relutância apenas refletia meu imenso preconceito por sua trajetória política, que, penso, macula inexoravelmente sua trajetória acadêmica. Afinal, o presidente Cardoso foi, a meu ver, politicamente covarde e perdeu oportunidades históricas de superar algumas de nossas sérias dificuldades sociais e econômicas. E tal história repete-se, infelizmente, com os governos petistas, apesar de achar que esses conseguiram avanços um pouco mais significativos do que aquele. Mas não é de política partidária que quero tratar, e sim de sociologia, e mais especificamente de Gilberto Freyre, que considero um dos maiores pensadores brasileiros, quiçá o maior (não poderia deixar de lembrar dum outro Freire, o Paulo, um gigante da filosofia da educação).

Cumpri meu ritual bibliográfico hebdomadário: peguei o livro que ora interessava-me, sentei-me numa mesa qualquer da cafeteria, cumprimentei as atendentes pelo nome e, antes de ter a oportunidade de pedir meu cappuccino, uma delas me perguntou: “o de sempre, senhor?”. Sorri, aquiesci e acresci: “bem quente!”.

Após ritual quase religioso, desliguei-me do burburinho ao meu redor e ajustei meu foco cognitivo à leitura em questão. As páginas foram passando com celeridade, indicando que a leitura era por demais agradável. Sim, eu vencera o preconceito inicial e aproveitava agora o bom texto crítico do ex-presidente. Fui direto ao capítulo sobre Gilberto Freyre, um dos “inventores” do pensamento brasileiro, segundo o autor. E nisso, posso adiantar, em total acordo com minha insipiente interpretação sobre a realidade brasileira. Sim, não há quem leia Casa-grande & senzala que não se sinta pleno de entendimento sobre a nossa realidade social. Não é apenas um clássico da sociologia nacional, é mais do que isso: é uma obra de arte que fala do Brasil com mágica, beleza e ciência. Um dos livros mais impactantes que já li. E não apenas o li, mas o estudei com os cuidados necessários à elaboração de uma dissertação acadêmica.

Apesar de reconhecer o mérito indelével do pensamento freyreano, o sociólogo Fernando Henrique reproduz uma crítica à sua obra que sói acontecer no ambiente acadêmico: Freyre seria um conservador e um disseminador da ideia da “democracia racial” brasileira, odiada por 10 entre cada 10 estudiosos das sociologia e antropologia tupiniquins. Sua obra seria uma ode ao falacioso sistema escravista condescendente e à visão pouco realista da situação do escravo em terras brasileiras. E nesse jogo dicotômico, no qual reconhece valores quase transcendentais na obra de Freyre ao mesmo tempo em que chega a propor certo “mal estar que sua obra causou, e quem sabe ainda cause, na academia”, reforça um preconceito quase juvenil a um constructo intelectual que beira o insuperável na sociologia nacional.

“Seu café, senhor”, diz-me a atendente com simpatia, trazendo-me à realidade da livraria e fazendo-me ouvir de novo o rumor do vai-e-vem e das conversas das pessoas à minha volta. A pausa foi essencial para sorver a bebida em seu calor original. Continuo minha leitura sempre breve na livraria, a ser concluída em ambiente mais propício: a tranquilidade do silêncio.

Em nova imersão no texto sobre minhas mãos, lembro-me de outras críticas já estudadas, como os comentários dos historiadores Robert Slenes e Cristiany Rocha, que veem Freyre apenas como um defensor da ideia do patriarcado como fonte singular da formação social brasileira, chegando a afirmar que esse “inventor do Brasil” compara o escravo a um animal sem controle dos instintos que vive em situação de prostituição doméstica. E aqui não poderia deixar de citar Casa-grande & senzala explicitamente:

temos que reconhecer o fato de que desde os dias coloniais vêm se mantendo no Brasil, e condicionando sua formação, formas de organização de famílias extrapatriarcais, extracatólicas que o sociólogo não tem, entretanto, o direito de confundir com prostituição e promiscuidade. Várias delas parecem ter aqui se desenvolvido como resultado de influência africana, isto é, como reflexos, em nossa sociedade compósita, de sistemas morais e religiosos diversos do lusitano-católico, mas de modo nenhum imorais para grande número de seus praticantes” (Global, 2004, p.130).

Não obstante a clareza do discurso freyreano acima bem ilustrada, questiono-me se há realmente problemas científicos nesse clássico da sociologia nacional ou se as críticas que leio não passam de má vontade por parte de alguns estudiosos mais interessados em propagar mitos raciais. Como diria a socióloga Cynthia Sarti, Freyre desperta uma “apreensão” no meio das ciências sociais; apreensão, complemento, causada pelo vigoroso painel que expõe das relações sociais, culturais, étnicas e econômicas, impedindo a construção do mito racial inverso àquele que se culpa Freyre. E o ex-presidente, em coro, afirma ser a obra em discussão uma construção mistificadora, adjetivo posto garrido de sofisticações que ainda assim não esconde a dureza da crítica, haja vista a desconexão óbvia, conforme o fragmento exposto, entre a obra e o pensamento dos que sofreram do “mal estar” por ela causado.

A obra de Freyre ainda carece de crítica mais bem fundamentada. Talvez o tempo e a maturação de seu conteúdo entre os estudiosos permitam uma análise menos ideológica e mais racional. Culpá-lo de mistificar as diferentes participações étnicas na formação socioeconômica brasileira, baseando-se apenas num desejo nada científico de criar situações que os fatos históricos não corroboram, é justamente mistificar, num sentido mais preciso. É fato que não tenho pendores de Teseu, mas obrigar Freyre a deitar no leito de Procusto é, no mínimo, uma injustiça intelectual.

Acabou o café. Fechei o livro. Paguei a conta. Fui-me embora. Em casa terei boa leitura garantida e uma discussão solitária a travar com um ex-presidente.
Powered By Blogger