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segunda-feira, 3 de outubro de 2005

Por um espiritismo kardecista

Artigo de Sergio Mauricio publicado na coluna Religião do Jornal A Tarde, Salvador, BA, em 10/11/2003.

Todos nós espíritas vivemos a experiência de sermos questionados a respeito de qual espiritismo somos adeptos, se kardecista ou outro. A resposta padrão é sempre imediata: não há tipos de espiritismo, todo espírita é necessariamente kardecista, pois espiritismo e espírita foram neologismos criados por Allan Kardec na introdução de O livro dos espíritos. Assim, falar de espiritismo kardecista seria uma redundância, como falar "subir para cima". Por perceber a constância dessa dúvida, tenho tido sempre o cuidado de esclarecer esse ponto nas palestras e nas conversas informais.

Não penso mais assim. Tenho revisto essa postura e esse conhecimento. Diante de tudo que ouço e vejo acontecer nas casas espíritas, passei a meditar mais sobre esse aspecto que parecia ser claro e não permitiria divergências de posicionamento.

Muitos espíritas defendem posições e práticas que não têm fundamento nas obras kardecistas, mas que, quando alertados, afirmam que estão de acordo com o espírito fulano ou o renomado escritor sicrano. Volto a interrogar, e Kardec? Para a minha surpresa (ou não deveria?), acabo ouvindo a falta de interesse em conhecê-lo com mais profundidade e propriedade, preferindo tangenciar o espiritismo através de obras de valor duvidoso, conhecidas com o pretensioso título de obras complementares.

Alguns nomes do meio espírita brasileiro passaram a ser inquestionáveis e suas obras consideradas como patrimônio a ser incorporado às obras de Kardec. Não é a intenção questionar o valor e a qualidade de determinadas obras, mas daí a considerá-las verdades a serem simplesmente seguidas vai uma longa e complexa distância. Já vivi a experiência de colocar em questão determinada idéia de uma obra de um famoso médium, que claramente não coadunava com as contidas na obra kardecista, e fui considerado quase um herege, um radical, um purista ortodoxo. Acreditava ser apenas espírita. Pois assim como devemos colocar em questão as mensagens recebidas dos espíritos, seja por qual médium for, assim preconizava Kardec na sua obra O livro dos médiuns, devemos também, por força da nossa razão e do mesmo princípio anterior, perscrutar qualquer informação publicada por espíritas, independente da sua projeção alcançada.

O desejo de venerar e seguir nomes eméritos por vezes cega o profitente espírita, que acaba por santificar homens e espíritos, ao invés de respeitá-los por sua contribuição intelectual, passível, como qualquer outra, de dúvidas e discordâncias.

A fé raciocinada, tão falada e tão pouco vivida, é expressão antiga; Agostinho já a utilizava no séc. IV, bem como outros pensadores cristãos da Idade Média. Mas nós, os espíritas, apropriamo-nos desta expressão como se original fosse, no intuito de praticá-la efetivamente. Todavia o que se vê é uma necessidade imensa de acreditar na primeira revelação messiânica que chega, impedindo qualquer interrogação, fato verificado até nas reuniões mediúnicas, quando aparece algum "mentor", todos se calam e não ousam sequer travar um diálogo com o espírito, com receio de ser impertinente.

A argumentação contrária parte sempre do princípio que o espiritismo não é um corpo doutrinário fechado, acabado, e sim em constante desenvolvimento, como já dizia o próprio Kardec no primeiro capítulo de A gênese. Isso é claro, mas o desenvolvimento natural do espiritismo se dará através da grande contribuição kardecista: o método científico aplicado ao seu objeto de estudo. A evolução do espiritismo não se dará através de revelações de nenhum espírito em particular, como hoje se tem propagado amiúde, pervertendo por completo o legado espírita, tornando-o, agora sim, um corpo doutrinário dogmático e inquestionável.

Esses "complementos" à obra kardecista acabaram por formar um novo espiritismo, sem qualquer fundamento racional ou científico, igualando-o às religiões dogmáticas, obrigando seus adeptos a acatarem como certezas os mais mirabolantes sistemas de idéias. Assim, surgiu todo um "novo" conhecimento espírita que é propagado através das palestras, dos cursos introdutórios e das obras publicadas a mancheias, que falam em corpos astrais de cores e quantidades diversas, que ensinam sobre chacras e carmas, que propalam tratamentos e técnicas de passes, relegando a obra kardecista a um lugar secundário, se chegar a tanto. Diante dessas e de outras toleimas, compreendi que, em verdade, sou espírita kardecista sim, bem diferente de outras posições encontradas em casas autodenominadas espíritas.

2 comentários:

carlos muller disse...

Quando praticava o catolicismo, eu já tinha restrições quanto a veneração aos santos, deixando sempre Deus em segundo plano.No kardecismo tudo se encaminha para esse rumo. Venera-se espíritos,ditos mentores, e Deus fica em segundo plano. Os espíritos podem nos instruir mas precisamos ter a convicção de somente encontramos paz em Deus.

Anônimo disse...

continuação:Espíritos evoluidos não se aborrecem com isso. Eles estão tentando nos auxiliar para que busquemos a Deus, não a eles. O que o homem decide ele muda, mas o que Deus decidiu está instituido nas 3 regras básicas da evolução: O amor, a caridade e o perdão. Quando assimilar-mos estas regras estaremos perto da perfeição.Deus ilumine a todos.

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