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terça-feira, 7 de setembro de 2010

Estatuto do Nascituro: ameaça para todos

Fonte: Aborto em Debate
http://www.abortoemdebate.com.br/wordpress/?p=1168

O Projeto de Lei 478/07, mais conhecido como Estatuto do Nascituro, ameaça a saúde de todos os brasileiros e brasileiras, mas principalmente das mulheres grávidas, em especial as enfermas, as mais pobres, e as sem acesso a informação e cuidados de saúde adequados.

Basicamente, o que o Projeto de Lei faz é dar “plena proteção” e “prioridade absoluta” ao nascituro, definido como “o ser humano concebido, mas ainda não nascido”, incluindo os seres humanos “concebidos in vitro, mesmo antes da implantação no útero da mulher“, além de determinar a punição de qualquer “violação” de seus direitos, por “ação ou omissão”. Com isso, impede a pesquisa com células-tronco embrionárias, restringe o acesso de mulheres grávidas ao aborto terapêutico e a uma série de tratamentos de saúde, e pode criminalizar gestantes por atos tão simples como fazer o trabalho doméstico. Cria ainda a surreal situação em que um embrião fertilizado in vitro, mantido no estoque de uma clínica de fertilização, merece uma proteção mais ampla do que uma pessoa já nascida, e um embrião implantado há um dia no útero da mulher teria prioridade de atendimento (por exemplo, em assistência médica) sobre um recém-nascido.

Veja abaixo quais são os problemas com o Estatuto do Nascituro:

- Proibição do aborto terapêutico e restrição da gestante a tratamentos de saúde contra doenças como o câncer: O Art. 4º do PL diz que o nascituro deve ter assegurado, com absoluta prioridade, entre outras coisas, seu direito à vida, à saúde e ao desenvolvimento. “Absoluta prioridade” significa prioridade sobre qualquer direito de qualquer pessoa, inclusive os da mulher que o carrega. Isso significa que a gravidez não pode ser interrompida mesmo que ameace a saúde da gestante, pois a “vida” do feto tem prioridade sobre a saúde da mulher. Como o Art. 5º do projeto determina que qualquer “violência” contra o nascituro será punida na forma da lei, um tratamento de saúde que ameace a continuidade da gravidez pode ser considerado ilegal, com a consequente punição dos profissionais responsáveis por ele e da paciente. Quando os abortos terapêuticos foram proibidos na Nicarágua, em 2006, os profissionais de saúde passaram a trabalhar com tanto medo de persecução penal e perda das licenças profissionais, que a consequência foi que gestantes tornaram-se incapazes de ter acesso a tratamentos como quimioterapia, radioterapia, cirurgia cardíaca e até mesmo analgésicos, pois tudo isso pode afetar o embrião ou feto. O medo de participar em um processo de abortamento (espontâneo ou provocado), mesmo que seja para interrompê-lo, é tão grande que mulheres com hemorragia simplesmente não recebem atendimento médico. Segundo a organização internacional Human Rights Watch, só no primeiro ano de legislação proibitiva, 82 mulheres morreram.

- Criminalização de mulheres grávidas e do aborto espontâneo: Em países com legislações que punem atos contra o nascituro, como os EUA, mulheres grávidas são tratadas como criminosas em potencial. Em alguns Estados, elas podem ser investigadas e processadas se consideradas responsáveis por atos que ameacem o feto. Em outros, podem ser internadas contra sua vontade em hospitais, mesmo que a existência de filhos pequenos ou a necessidade de trabalhar tornem a estadia extremamente desaconselhável. Em alguns lugares, podem ser condenadas por homicídio se consideradas responsáveis pelo nascimento de um bebê natimorto. Essa lei criminalizaria principalmente mulheres pobres por não ter acesso a informação e a uma rede de apoio adequada. Talvez fazer trabalhos domésticos pesados, carregar crianças no colo, andar de moto ou de bicicleta, apenas para citar alguns exemplos, não sejam os atos mais recomendáveis para uma mulher com uma gravidez de risco. Mas muitas vezes não existe alternativa para a mulher que é pobre, mãe solteira, não pode deixar de trabalhar e não tem ninguém que possa cuidar de sua familia, ou que possa fazê-lo permanentemente. Embora algumas gestações exijam que a mulher faça pouco ou nenhum esforço, o repouso absoluto não é uma opção para a grande maioria das mulheres brasileiras. E nenhuma mulher deveria ser punida por tentar prover sua subsistência e a de sua família.

Mesmo quando o ato é claramente prejudicial, como o fumo ou o uso de drogas, a criminalização do comportamento da mulher durante a gravidez é desaconselhada por todos os organismos de saúde que já conduziram estudos sobre o tema. Nos EUA, onde gestantes podem ser presas e perder a guarda dos filhos por uso de drogas durante a gravidez, algumas cidades chegam ao cúmulo de conduzir testes toxicológicos em todas as pacientes que chegam ao hospital para dar à luz ou buscando cuidados pré-natais. Se é descoberta a presença de drogas no organismo, a polícia é chamada e a mulher é imediatamente presa (algumas ainda sangrando devido a complicações do parto). A Associação Americana de Saúde Pública, Associação Médica Americana, e o Conselho Nacional de Uso de Drogas e Álcool são contra a persecução criminal de gestantes por uso de drogas, já que numerosos estudos comprovam que tal política evita que as mulheres procurem cuidados pré-natais e tratamento contra a dependência, causando muito mais mal a sua saúde e à do feto.

Existe ainda o problema de determinar exatamente o que foi responsável pela “violação ao direito do embrião”. Há que se perguntar se é sensato submeter uma mulher que acabou de passar pela experiência traumatizante de um aborto espontâneo (evento que pode ocorrer em cerca de 25% das gestações) a uma investigação para determinar sua culpa no evento, e quem sabe puni-la por isso. É um verdadeiro atentado contra sua saúde mental, considerando que a maioria das mulheres experimenta sensação de culpa pelo abortamento, independentemente de sua responsabilidade nele, e sintomas de depressão e luto que, sem tratamento, podem inclusive agravar-se para um quadro de depressão clínica. Apontar o dedo para esta mulher em busca de sua parcela de culpa no evento é violar o direito constitucional de não sofrer tratamento cruel, desumano ou degradante.

- Proibição e criminalização de pesquisas com células-tronco: a pesquisa com células-tronco embrionárias, realizada com embriões fertlizados “in vitro” , é de enorme importância na busca de cura para doenças hoje consideradas incuráveis, como a distrofia muscular progressiva (doença que gera degeneração dos músculos, culminando em comprometimento dos músculos cardíacos e respiratórios), diabetes, doenças neuromusculares, renais, cardíacas ou hepáticas. Ela é realizada com embriões que seriam descartados por clínicas de fertilização in vitro. O Supremo Tribunal Federal decidiu em 2008 que esse tipo de pesquisa não viola o “direito à vida” do embrião, pois este direito é inexistente, e integra o direito fundamental à saúde. Já que o Estatuto do Nascituro pretende punir qualquer violação ao direito à vida de embriões, inclusive os fertilizados in vitro, o Projeto passa por cima da interpretação do STF, guardião e intérprete maior da Constituição, viola o direito inviolável à saúde, e pretende reinstaurar a vergonhosa situação em que embriões que poderiam salvar vidas eram descartados no lixo.

CHAMADO PARA AÇÃO: ASSINE A PETIÇÃO CONTRA O ESTATUTO DO NASCITURO

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