Toda eleição presidencial é a mesma coisa: o Nordeste
brasileiro não vota como querem os paulistas e, pronto, lá vem uma enxurrada de
ofensas racistas e xenófobas. Afora o fato de que a democracia pressupõe
exatamente esse combate de ideias, prevalecendo aquela que conseguir mais
adeptos, a expressão de ódio e preconceito que se vê nas redes sociais esconde
algo mais grave.
As manifestações raivosas que se fizeram representar após o
resultado político de ontem trazem uma proposta clara: um golpe à democracia. A
não aceitação dum resultado democrático, seja ele qual for, revela um desejo
mórbido de se impor pela força, de calar o diferente, de não permitir a
expressão legítima do discurso contrário. Esses doentes políticos, que foram
vistos nas manifestações de junho de 2013 portando cartazes exaltando a
ditadura e a censura, são um risco à democracia.
Lembro-me de Locke, em sua
Carta sobre a tolerância, afirmando
que a tolerância é uma virtude a ser cultivada, mas que os intolerantes não
devem ser tolerados numa sociedade saudável, sob o risco de ruir os princípios
do convívio social e democrático. Por conta dessa ideia é que as sociedades
civilizadas impõem sanções penais aos preconceituosos e aos propagadores do
discurso do ódio. É uma forma de extirpar aqueles que trazem riscos aos
princípios mínimos de civilidade e cidadania.
Ou seja, não é democrático tolerar o discurso racista,
xenófobo ou homofóbico. Isso deve ser tratado como crime e um golpe mortal à
democracia e aos direitos de cidadania. Deve-se tolerar e discutir todo tipo de
ideia social, política, econômica ou filosófica, menos aquelas que usurpam,
mesmo que implicitamente, o direito alheio de expressão legítima de sua
cidadania.